Saiba quem pode ter acesso às imagens gravadas no CFTV do condomínio
Hoje em dia, especialmente em razão da violência que domina o país, o uso de câmeras de monitoramento em condomínios é frequente, porém ainda existem dúvidas e discussões com relação a quem, com qual finalidade e quando as gravações podem ser acessadas e utilizadas, razão pela qual é necessário entendermos algumas situações legais que acercam o tema.
DA LEGISLAÇÃO
É importante ressaltar que não há nenhuma Lei Federal obrigando que o condomínio tenha o equipamento de monitoramento instalado, sendo facultado aos condomínios ter ou não ter o equipamento, e, quando não contido no memorial descritivo do empreendimento, sua instalação dependerá de aprovação em assembleia. No caso, pelas características e finalidades do equipamento, entendo que para a sua aprovação é necessário apenas o voto da maioria dos presentes.
Instalado o sistema, caberá ao condomínio verificar se existe alguma norma Estadual ou Municipal que regulamente o seu uso. Em São Paulo, temos a existência da Lei 13.541/2003 que determina a fixação de placas informativas com os dizeres “O AMBIENTE ESTÁ SENDO FILMADO. AS IMAGENS SÃO CONFIDENCIAIS E PROTEGIDAS NOS TERMOS DA LEI.”
Esta Lei não obriga ter uma placa sob cada câmera e sim apenas uma, de fácil localização e leitura, na entrada e saída dos ambientes monitorados. Por exemplo: portaria de entrada, portaria da garagem, elevadores, sala de ginástica e etc.
DO ACESSO AS IMAGENS
Para analisarmos quem poderá ou não ter acesso as imagens e gravações do circuito interno de TV do Condomínio, é importante que as pessoas entendam que: a finalidade do sistema é a preservação do patrimônio e da segurança do condomínio e seus moradores.
Com base nesse princípio, é possível de pronto excluir o direito de livre acesso por parte de qualquer condômino, síndico ou terceiros às gravações existentes no monitoramento.
Por exemplo: é muito comum pedir ao síndico ou responsável pela administração o direito em analisar as imagens captadas quando alguém suspeita de infidelidade em seu relacionamento, mas isso é proibido, pois a finalidade das gravações não é monitorar a vida das pessoas.
Em outras ocasiões imagens são solicitadas para verificar se existiu o uso de entorpecentes, agressões ou outra situação que possa ter um desfecho penal. Quando isso ocorrer é prudente que o responsável veja sozinho as gravações, realize um backup das imagens salvando-a em mídia digital e solicite ao interessado que requisite formalmente as imagens ou até mesmo por via judicial, requerimento Policial ou qualquer outro órgão público.
Portanto, conclui-se que: a cessão de imagens para solucionar questões de cunho pessoal ou qualquer outra que não seja o resguardo do patrimônio e a segurança do Condomínio não deve ser permitida, sob pena de responsabilidade civil e penal do seu representante (síndico). Vale lembrar que se a gravação for de extrema importância, o interessado poderá utilizar dos meios legais válidos para ter acesso ao seu conteúdo.
DA UTILIZAÇÃO DAS FILMAGENS PARA VERIFICAÇÃO DE DANOS
Outra situação extremamente frequente é o pedido para analisar as imagens e verificar a ocorrência de danos sofridos, principalmente em veículos, furtos ou outra situação que tenha causado prejuízo material. Quanto a isso, por estarmos diante de um bem patrimonial, entendemos que não há problema na busca de informações através das imagens gravadas e fornecimento de cópia ao interessado.
Antes, porém, o síndico deve ter a cautela de verificar se o dano alegado não está sendo utilizado como subterfúgio para monitorar outras situações, razão pela qual é sempre importante que o síndico faça uma análise prévia dessas imagens, evitando assim divulgar, na mesma gravação, outras situações protegidas por Lei. Além disso, as imagens cedidas devem ser restritas e focadas somente no local especifico, ou seja, se a alegação é de dano ao veículo, não será permitido ao interessado analisar o que ocorreu na imagem da câmera do elevador e etc.
DO USO DA IMAGEM PARA APLICAÇÕES DE MULTAS E SANÇÕES CONDOMINIAIS
Acredito que quanto a isso o assunto seja um pouco mais polêmico e precisa ser tratado com seriedade e isenção, pois, ainda que as regras condominiais devam ser cumpridas, quando há desrespeito às normas, respeitando entendimento em contrário, entendemos que QUALQUER APLICAÇÃO DE SANÇÃO DEVE SER MOTIVADA PRIMEIRAMENTE PELO REGISTRO DA OCORRÊNCIA NO LIVRO APROPRIADO para, posteriormente, se necessário, obter-se a comprovação por imagem, apenas para embasamento legal da penalidade aplicada.
Portanto, orientamos os síndicos ao seguinte princípio fundamental: se há uma infração às regras condominiais e a mesma não foi apontada quando da sua ocorrência, especialmente quando estamos diante de fatos não relacionados a danos patrimoniais, subentende-se que naquele momento a eventual infração não perturbou ou causou qualquer risco ao condomínio e à vida condominial, tanto que inexistiu qualquer reclamação.
Em casos assim, se a ocorrência não causou transtorno ou prejuízo algum, por qual motivo punir? Por exemplo: se pelas regras condominiais, é permitido o uso da piscina por apenas dois visitantes e um condômino leva um terceiro, num dia que a piscina estava vazia e não prejudicou ninguém e tampouco houve reclamação registrada no livro, é fato que a infração da norma não causou nenhum embaraço ou dano ao patrimônio, não sendo correto aplicar-se uma multa apenas pelo registro de uma imagem, pois se passarmos a aceitar que o sistema de monitoramento poderá ser utilizado livremente para punir toda e qualquer infração, criaremos uma espécie de “Big Brother” e inúmeras controvérsias e questionamentos poderão surgir contra isso, pois, dessa forma, dar-se-á um poder abusivo e exclusivo a quem monitora 24 horas por dia essas imagens, podendo, om isso, haver perseguições ou punições desnecessárias.
O questionamento é salutar, especialmente pela certeza de que vivemos em sociedade e não raramente existem desencontros e empatias entre síndico e moradores, que poderão passar a ser monitorados de forma mais intensa do que outras pessoas que porventura possuam um laço de amizade ou sejam mais próximos. Ou seja, se permitirmos a punição apenas por registro de imagem de uma situação que passou despercebida e não causou nenhum prejuízo, estaremos legitimando que o síndico ou o responsável pelo monitoramento busque nos registros das imagens os passos de um possível desafeto e puna-o com frequência.
Assim, entendemos que a aplicação de sanções que não envolvam dano patrimonial, baseadas apenas em imagens obtidas por câmeras e sem prévio registro de ocorrência é irregular, salvo se existir nas regras condominiais alguma autorização para isso, e mesmo assim estaremos diante de uma situação discutível legalmente.
Porém, quando estamos diante de infrações que culminem com a existência de danos, acho que a busca no registro de imagens é plenamente possível e necessária, mas deve ser utilizada para focar apenas a situação especifica. Por exemplo, se um espelho do hall social aparecer quebrado, entendemos ser plenamente legitimo que o síndico busque no registro das gravações o responsável pela ocorrência e puna-o.
DA LIBERAÇÃO DE ALGUNS CANAIS DE ACESSO
Outrossim, como a essência do monitoramento é a segurança, entendemos ser possível é até útil, que alguns pontos de monitoramento sejam liberados para os condôminos visualizar (por intermédio de internet, redes de cabos etc), esses pontos podem ser as imagens localizadas na portaria ou outro ponto estratégico voltado exclusivamente para segurança, ou seja, pontos em que caso exista alguma rendição de funcionários as imagens possam ser captadas, mas respeitada a privacidade dos trabalhadores, que deverão ser previamente comunicados que o ambiente é filmado, evitando assim discussões na esfera trabalhista.
Outro ponto possível de compartilhamento é o das imagens captadas em “vagas de pânico”, procedimento utilizado por vários condomínios que destinam uma vaga da garagem para ser utilizada em caso de emergência pelos condôminos.
Porém, todos os demais locais, especialmente elevadores, salões, piscina, garagem e outros que possam vigiar a vida pessoal dos frequentadores devem ser proibidos de compartilhamento ou exposição.
DAS NORMAS ENVOLVIDAS
Como já abordado em outras ocasiões, existe no Brasil uma hierarquia de Leis, de tal sorte que o contido na Convenção Condominial deverá sempre respeitar a Lei maior. E a Constituição garante a todos o direito à privacidade, senão vejamos:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
Extrai-se, portanto, pelo dispositivo constitucional o veto à violação da intimidade, vida privada, honra e a imagem das pessoas, por conseguinte fazer uso, divulgar, não zelar pela guarda das imagens é ilegal cabível de indenização e punição dos responsáveis, com lastro nos artigos 186 e 927 do CC.
“Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.
“Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”.
Em contrapartida, quando as imagens forem solicitadas pela justiça ou necessárias para manutenção da ordem pública, o síndico deverá fornecer, porém, de forma restrita ao conteúdo da solicitação formal realizada por quem de direito, nos moldes do previsto no Código Civil.
Art. 20. Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais.
Art. 21. A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma.
Em qualquer outra situação, a divulgação das imagens obtidas dentro do condomínio é ilegal e autorizará ao lesado, em caso de prejuízo, buscar por indenização judicial na esfera civil e, dependendo da situação, no âmbito penal, em face do condomínio, síndico e, eventualmente, dos demais envolvidos e com boas chances de êxito no pleito.
Portanto, considerando que a utilização do sistema de monitoramento de câmeras nos condomínios é de extrema importância, é indispensável que o Síndico tenha completa ciência das regras de uso, acesso e armazenagem do material gravado, com lastro na Lei, evitando assim que um item com destinação especifica seja utilizado de forma errônea.